sino

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Conexões

À frente de Sonia, ela começou a falar. Explicou como tinha chegado até lá e que havia decidido não falar sobre si até então pois acreditava que isto daria à terapeuta "material" para "criar" uma regressão. Falou de sua surpresa com o resultado, que realmente lhe trouxera imagens sobre as quais já havia pensado antes.
 Contou sobre a sensação de "ver" as cenas enquanto Sonia falava.

Sonia disse que ver as cenas era algo muito raro.Em geral, as pessoas ao ouvirem as histórias narradas , acompanhavam o enredo como se estivessem lendo um livro.

Mas ela confirmou que em seu caso as coisas eram mais claras, chegava a sentir aromas dos lugares.

Sonia perguntou-lhe se reconhecia pessoas das histórias que estivessem ao seu lado nesta vida.

Ela disse que tinha desconfianças, mas gostaria de saber que tipo de informação Sonia poderia dar a este respeito.

A terapeuta explicou que,por suas teorias e crenças era comum que o mesmo grupo de pessoas voltasse a se reunir em várias vidas, ou dimensões, como muitos preferiam, mas que para que ela própria pudesse fazer conexões, teria que ter recebido informações sobre ela antes das regressões. Mas, que o que lhe chamou a atenção foram as presenças de Frederico (na vida de Zaira) e George (na de Mildred), que lhe pareciam sugerir que fossem 2 outras encarnações de Lucas, já que Sonia tinha a certeza de que as 2 moças eram as antigas personalidades dela.

Ela então resolveu falar claramente sobre as conexões que fizera durante as regressões e no intervalo entre as duas.

Suas impressões foram muito claras. Frederico e George com certeza eram Lucas. E para ela isto explicava sua relação quase simbiótica com ele. Era como quisesse se desculpar pelo que fizera nos tempos de Mildred ou quisesse aproveitar até o fim a aventura com Frederico.

Uma coisa, ela interpretou de forma errada, mas só viria a saber disso anos mais tarde, quando sua relação com Lucas terminou. Ela imaginou que Mary, a noiva prometida de George, fosse Sonia, a esposa de Lucas. Mas na verdade,era Maura, que na vida atual, também havia sido apaixonada por Lucas desde menina, mas tinha sido "trocada" por ela, que por fim o "devolvera" à Maura que sempre esperara por isto.A esposa de Lucas, entrara na vida deles por motivos que não chegaria a descobrir.

Outra coisa que a impressionou bastante foi o fato de Mildred ter desaparecido e sido morta pela Inquisição. Ela, sempre se interessou por ervas e plantas medicinais e teve uma facilidade imensa de trabalhar com os Florais de Bach, técnica que utiliza plantas inglesas, e era chamada de "bruxa" por muitos, mesmo que de forma jocosa.  Além disso, as histórias sobre a inquisição e seus absurdos a deixavam muito impressionada, o que também a fazia ter certa resistência aos ritos católicos.

 Outro fato marcanate é que uma grande amiga sua, também se submeteu à regressão naquela época e isso as fez compreender a ligaçao muito forte entre as duas, embora fossem tão diferentes que ela as vezes não sabia se a amava ou odiava. É que esta amiga, Olívia, também trabalhava da mesma forma que Mildred, foram presas juntas, mas para fugir da punição, esta amiga refugiou-se em um convento, fingindo ter se convertido. Esta situação foi vista por Mildred como uma traição, e foi com este sentimento que ela deixou este mundo.

Quanto à família de Zaira, ela teve muitos insights! A mãe, era exatamente como a sua desta vida. Implicava com tudo o tempo todo e queria que a filha arrumasse um marido pacato mas que cuidasse dela. Afastava todos os seus pretendentes e ainda fazia com que ela, por si mesma, evitasse envolver-se com outros rapazes pois sabia a resistência que a mãe criaria.

 Jan, era com certeza seu pai desta vida. Alegre, paciente, amante da música e das viagens. Apoiava a filha em tudo que precisasse e nunca se afastava dela.

Depois desta sessão, ela voltou ao consultório várias outras vezes,mas nem sempre para regressões, mas para analisar as informações obtidas.

Muitas coisas em sua vida ficaram mais claras, embora ela levasse muitos anos para compreender que sua relação com Lucas já não tinha sentido.E isso só aconteceu porque ele pôs fim ao relacionamento.

Foram anos, usando as regressões como elos entre passado e futuro, entre consciente e inconsciente...

Foi uma experiência muito válida embora em sua cabeça sempre pairavam questões e mais questões.

As tais vidas passadas existiam ou eram meras ilusões?

Mas se eram ilusões, como Sonia as descrevia tão bem?

Nosso destino está pré-determinado?

Conhecer vidas anteriores pode nos ajudar a compreender a atual?

Ou estas histórias seriam fruto de dimensões paralelas nas quais estaríamos envolvidos?

Não importa. O que importa é que com o passar do tempo, a publicação do livro, o apoio dos velhos amigos em especial Miguel e Lin, (que ela ainda encontraria em outras vidas!), ela tomou posse de si.

Outros relacionamentos surgiram em sua vida, homens muito mais interessantes do que Lucas foi um dia.

E ela sabia, que seria uma questão de tempo e auto-conhecimento para que um grande amor nascesse em seu coração e ela sentisse que era a hora de construir algo ao lado de alguém.

Não pensava em relações do tipo "até que a morte os separe", afinal, tivera a oportunidade de saber que isso não existia, a vida anda em ciclos, e participamos deles eternamente.

O importante é construir o amor, pelas coisas, pela natureza, pelos animais, pelas pessoas.

Enfim, a busca da Paz e o Prazer.

 
                                                           FIM

sábado, 16 de outubro de 2010

2ª Regressão

Os 15 dias demoraram a passar, e meia hora antes do horário marcado ela estava lá, louca para continuar aquilo que poderia ser sua pré-história pessoal

Sonia sempre tranquila e sorridente nem precisou dar orientações porque ela entrou e já "pulou" para a maca de cromoterapia. A terapeuta teve que fazê-la entender que a ansiedade exagerada só iria atrapalhar. E ela obedeceu, respirando e relaxando como o indicado. Nunca soube se este (a ansiedade) fora o motivo de a sessão acontecer de um modo diferente, sem apresentação de diálogos. Desta vez foi uma descrição dos fatos, mas também acompanhada de uma vivência quase física dos acontecimentos. Foi assim:

Espanha, norte da Catalunha. 1826. Uma tenda ao estilo cigano.

Aquela era uma "casa" cheia de movimento e música, mas também repleta de frustrações.

O chefe da família, Jan, é de origem cigana, da Europa oriental e sua família viera para a Espanha há muitos anos. Jan era apenas um menino de 15 anos, mas ao passarem pela França apaixonara-se perdidamente por Marie, sua Marie de la mer (referência à Santa protetora dos ciganos). Passaram-se 3 anos até que Jan conseguisse criar coragem e romper com a família, separando-se deles e levar Marie para viver com ele naquelas areias espanholas. De suas tradições mantivera a tenda, o comércio de cobre e o amor pela música que interpretava tão bem, agora em sua guitarra. Tiveram uma única filha, Zaira.

Marie, uniu-se a Jan por puro encantamento, por paixão. Mas ao longo dos tempos, incomodou-se com aquele estilo de vida sem conforto e segundo ela instável e sem futuro. Reclamava o tempo todo, mas continuava ali, cuidando da tenda e da filha.

Zaira crescera ouvindo as histórias do pai sobre sua gente e confrontando-as com as histórias da mãe sobre as maravilhas da sofisticada França. Casara-se aos 19 anos com Juan, mais por convenção e por insistência da mãe de que este era o caminho correto para uma moça. Todos os finais de tarde unia-se ao pai que tocava para que ela dançasse. E foi num dia assim, onde Zaira mostrava seus dotes de dançarina que Juan chegou à tenda em busca de objetos em cobre. Foi amor à primeira vista.  Tiveram 3 filhos lindos. Zaira os amava muito e envolvia-os nas danças e músicas do pai. Eram muito alegres e festivos, exceto Marie, que além das reclamações sobre o marido, também implicava muito com o genro.

O casamento de Zaira e Juan era algo morno, convencional. O rapaz não tinha ambições, muito menos sonhos. Juan percebia a indiferença da filha, mas agia como se não percebesse até para não provocar ainda mais a ira da mulher que dizia que o genro não tinha pulso como marido.

Zaira porém, apesar do amor pela companhia do pai e o amor pelos filhos, guardava no coração um desejo enorme de conhecer outros lugares,de exercer ao menos um pouco a atividade de seus ancestrais, a andança, como dizia.

Em uma manhã de domingo, Jan estava mais animado do que nunca e junto com os netos, agora com 3, 5 e 7 anos, iniciou mais cedo a cantoria. Logo Zaira juntou-se a eles. Mal perceberam a aproximação de um cavaleiro que pediu autorização para aproximar-se. Pararam de dançar e cantar para receber o viajante que pedia informações. Convidaram-no a tomar um copo de vinho enquanto descansava. Zaira os serviu e ficou por perto ouvindo a conversa. O nome do rapaz era Frederico, viajava pela região aceitando pequenos trabalhos que lhe dessem o suficiente para correr mais e mais trechos, conhecer lugares. Enquanto Zaira encantava-se a cada palavra dele, Marie sentia aversão aquele que lhe parecia um vagabundo sem rumo.

Marie não gostou quando Jan lhe ofereceu pouso por alguns dias e Frederico aceitou.

Foram dias devastadores naquela família. Além de encantar Jan e  as crianças com sua fala fácil e atraente , Frederico arrebatou o coração de Zaira com suas histórias. Na véspera da partida do simpático Frederico, Jan e as crianças fizeram uma despedida com muita música. Frederico que já os observara todos aqueles dias, pediu autorização a Juan para dançar com sua mulher. Juan aceitou para desespero de Marie que via o brilho nos olhos da filha. Zaira pela primeira vez na vida teve dificuldades para manter o ritmo de seus volteios. Os olhos de Frederico fixos nos seus a desequilibravam Mantinha uma distância adequada, mas em um momento em que estavam próximos ele disse a Zaira que teria enorme prazer em tê-la em sua companhia quando partisse pela manhã. Zaira parou de dançar, arrumou uma desculpa e entrou. Os outros ainda tocaram e cantaram por algum tempo.

Zaira estava alucinada. Não conseguia conter seus impulsos. Partir com Frederico seria sua possibilidade de realizar seu sonho de conhecer o mundo. Mas e os filhos? O pai ela sabia que entenderia e que sempre poderia contar com ele. A mãe... jamais aceitaria nenhuma decisão, fosse ela qual fosse. Juan? Não teria reações e cuidaria dos meninos. Seu coração doía. Seu cérebro fervia. Mas estava encantada com Frederico e sabia que se não fosse embora agora, nunca mais o faria. Antes do amanhecer, enquanto todos dormiam escreveu uma longa carta ao pai explicando tudo,pedindo que cuidasse dos netos e que tentasse fazer com que Juan não a odiasse. Disse ainda que voltaria um dia e que esperava que a mãe a perdoasse. Pegou algumas roupas e saiu, esperando que Frederico acordasse logo. Quando saiu da tenda, avistou Frederico,  encostado em seu cavalo já preparado para partir. Correu até ele abraçou-o trêmula. Ele não disse nada, apenas ajudou-a a montar e partiram.

Foi Marie que encontrou a carta e fez um grande alarido. Gritava com o marido, querendo que ele fosse atrás da filha, evocando as regras de puritanismo feminino do mundo cigano. Jan nada dizia. Acusava o genro de todas as coisas, de não ter sido capaz de "domar" a mulher, de não ter voz para nada. E continuou a gritar até o dia de sua morte 8 anos depois.

Jan, secretamente apoiava a decisão da filha. Há muito não tinha em si as ideias de submissão da mulher, afinal, desde que deixou seu povo por uma delas, não sentia-se em condições de recorrer àquelas ideias.

Juan parecia não entender o que acontecera. Não demonstrava sentimentos de tristeza. Continuou como sempre convivendo com a despreocupação do sogro e a intolerância da sogra.

As crianças foram muito bem cuidadas especialmente pelo avô que lhes dizia que a mãe tinha ido atrás de histórias interessantes para contar quando voltasse. E viviam felizes, como as crianças fazem.

Zaira e Frederico correram "o mundo". Zaira era completamente apaixonada por aquele homem galante que tudo conhecia e a todos agradava. E ele era gentil e amoroso com ela. O que ela não sabia é que ele era assim com todas as belas mulheres que conhecia. E viveu nesta inocência por muitos anos, até que um dia, estavam chegando à França, Frederico a deixou em uma pequena pousada e disse que sairia para negociar uns tecidos que trouxera na bagagem. Nunca mais voltou. Zaira o procurou por muito tempo sem resultados. Não tinha recursos próprios e teve que trabalhar para a senhora da pousada por um bom tempo para reunir o suficiente para sair dali.

Sentia sim a falta de Juan, sofria, mas precisava sobreviver, e àquela altura sentia uma grande necessidade de voltar à Espanha e rever os pais e os filhos. Não sabia como seria recebida, mas tinha que fazer isto. Decidiu instalar-se em Barcelona antes de procurar a família. Alugou um pequeno quarto que tinha como mobília apenas uma cama, uma cadeira de balanço e uma estante onde guardou os livros que sobraram dos muitos que leu durante os anos de viagem. Dias depois de ajeitar-se na nova morada ela pegou a estrada para a antiga casa. Assim, quando quisesse teria um lugar para voltar, com a civilidade que adquirira em suas viagens.

Chegou em um começo de tarde e o cenário que avistou alegrou seu coração. Lá estavam Juan e Jan tocando seus instrumentos e um belo rapazinho aprendendo com eles. Antes que despertasse daquela visão que apertava seu coração entre medo e alegria, ouviu a voz do pai gritando: Zaira! minha pequena! Viu também quando Juan assustado abraçou por trás o jovem rapaz, que disvencilhou-se dele para acompanhar o avô. Juan a abraçou e beijou com lágrimas nos olhos. Zaira nem sabia o que dizer. Perguntou pela mãe, pelos filhos. Mas o pai ainda não conseguia falar, só queria olhar para ela. O rapazinho aproximou-se, olhou prá ela e disse - Mamãe? Zaira quasee não pode manter-se sobre as pernas. Abraçou o filho agora com 17 anos! Disse a ele que tinham muito a conversar, perguntou pelos irmãos e o rapaz disse que ia buscá-los. Saiu correndo para chamar os outros 2. Enquanto isso, Juan, deixou a tenda para o lado oposto da cabana de modo a não encontrar-se com Zaira. E ela perguntou ao pai pela mãe. Entristeceu-se em saber de sua morte, pediu desculpas ao pai por não estar ali mas falou da sensação boa de ter realizado seu sonho. O pai perguntou de Frederico, e ela apenas olhou prá ele que compreendeu o que acontecera. Teriam tempo para conversar. Enquanto isso, ao longe viram os 2 rapazes se aproximando. Eram o mais velho e o caçula que ele trouxera e que também abraçou a mãe e olhava-a como se fosse um milagre, com olhos brilhantes e sedentos de informações. Zaira perguntou pelo filho do meio. Os outros dois entreolharam-se e abaixaram os olhos sem saber o que dizer até que o mais velho explicou que ele não queria vê-la. Jan disse à filha que tivesse paciência que com o tempo tudo se resolveria. Ela assentiu e foram para a porta da tenda falando todos ao mesmo tempo.
A noite chegou, adormeceram e ao acordar na manhã seguinte perceberam que o outro filho e Juan não voltaram. Zaira entristeceu-se mas o pai a consolou. Decidiram que os 2 rapazes iriam com ela para conhecer a casa de Barcelona e que depois todos voltariam e decidiriam se permaneceriam ali, no lugar de sempre ou se todos iriam viver em Barcelona, onde havia maior possibilidade de trabalho para os rapazes. Jan temiaem deixar sua tenda, mas sabia que já não tinha idade para cuidar de tudo como gostaria, e ficar com a filha seria um prazer,

Os rapazes foram com ela para Barcelona, ficaram maravilhados com a grande cidade, mas tinham que decidir em conjunto com o avô o pai e o outro irmão.

Voltaram à tenda e Jan, meio tristonho disse que o outro filho e Juan não aceitavam a volta de Zaira. Ficou decidido que ela permaneceria em Barcelona até que a situação mudasse. O pai e os filhos a visitariam quando quisessem.

Mas as coisas não mudaram. Os anos se passaram e Zaira tinha que se contentar com as visitas da família e com suas idas à tenda sempre amargadas pela ausência de Juan e do outro filho. Ela os entendia, mas a culpa que sentia a deixavam muito deprimida. Só a presença do pai e dos filhos era capaz de consolá-la.

Às vezes eles passavam até 3 semanas sem visitá la. E foi em uma dessas visitas que os dois rapazes chegaram à casa de Barcelona e encontraram Zaira, agora aos 56 anos morta, sentada em sua cadeira de balanço com um livro aberto no colo. 

A nossa ela agitou-se com as últimas cenas e Sonia resolveu chama-la de volta. Ela retomou as energias, levantou-se e foi sentar-se diante de Sonia, disposta a finalmente falar de si mesma.
      

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Regressão Parte II

No 7º dia que George estava instalado lá, Mildred resolveu chama-lo para sua caminhada na praia. Ele que vivera esses dias como um encantado que obedecia ordens enquanto deslumbrava-se com sua deusa, sorriu finalmente.
E andaram em silêncio pela orla enquanto o vento gelado fazia voar os cachos de fogo de Mildred.
George não se atreveu a dizer palavra e nem notou os olhares por trás das janelas dos moradores da vila.
Mildred porém estava alerta quanto a uma pequena janela da casa anexa à igreja. E gostava de imaginar as lágrimas da menina por trás dela.
O passeio se repetiu por mais alguns dias em silêncio, até que em uma noite Mildred disse:
- Gosto que respeite o meu silêncio.
- Para mim senhorita, estar ao seu lado basta. Não percebe meus sentimentos?
- Que sentimentos? disse ela com cinismo.
-Senhorita eu a amo desde o primeiro dia que a vi quando ainda éramos crianças.
Fingindo surpresa Mildred disse:
- Minhas preces foram ouvidas! Sou amada pelo mais belo rapaz da vila! e jogou-se sobre ele em um abraço.
Naquela noite ele não dormiu no alpendre. E toda a vila percebeu.
O pai de George virava o rosto quando o avistava. A mãe o observava de longe,com tristeza. Os irmãos não tinham autorização para dirigir-se a ele e obedeciam com medo da reação do pai.
George nunca mais foi às reuniões da igreja onde uma tristonha Mary cuidava dos afazeres do culto,de sua casa e nada mais. A menina passava os dia fechada em seu quarto olhando o nada ou os visitantes noturnos da praia.
Mildred, que não tinha parentes vivos a quem dar satisfações, sentia-se à vontade para ir onde quisesse, inclusive à igreja.
George estava cada vez mais apaixonado. Fazia todas as vontades de Mildred e nem notava que ela pouco se interessava por ele. E assim foi por quase um ano.
Porém, em determinado momento, os excessos de cuidados dele, sua simples presença começaram a incomodá-la. Ela sentia falta da vida solitária de antes com a qual estava tão acostumada.
Além disso, o sofrimento de Mary já não lhe interessava. A moça tinha criado uma rotina de trabalho e reclusão. Deixara de ser divertido.
Mildred nunca havia almejado ter um marido, alguém que mais cedo ou mais tarde sairia daquele devaneio e começaria a lhe fazer cobranças, e antes que isso acontecesse, resolveu acabar com aquela situação.
No final do dia, quando George sentou-se par o jantar, ela disse:
- Fiz sua refeição favorita. Espero que aproveite, pois será a última.
- Como assim? Do que está falando?
-Não seja tolo George, Disse o que você ouviu! Esta é a última vez que você se senta nesta mesa. Amanhã pela manhã quero que deixe minha casa.
- Mas porque está fazendo isso? Não tenho feito tudo que posso? Não lhe dou todo o meu amor?
- Sim! Seu trabalho foi muito útil, mas agora é desnecessário.Gosto de viver sozinha e sinto falta disso. Quanto a amor... eu nunca pedi isso!
- Mas amor não se pede, se conquista!
- Pode ser George. Mas vejamos, você me ama. E o que eu tenho com isso? No dia que você apareceu aqui, o que lhe ofereci foi trabalho e hospitalidade. Além disso você está me obrigando a fazer algo que detesto: dar explicações! Por favor, deixe de ser ridículo, arrume suas coisas e saia pela manhã, como um homem!
Disse isso e saiu.
George passou aquela noite sentado ali, com a cabeça entre as mãos,atônito. Pela manhã, saiu sem saber direito o que fazer. Foi até a praia e sentou-se olhando para o horizonte. Nem percebeu o irmão que se aproximou  e disse: O que faz aqui a esta hora?
- George, olhos perdidos voltou-se e disse:
-Ronald! Há quanto tempo! E abraçou-se  ao irmão chorando.
- O que houve George.
E George contou-lhe. O irmão ouviu sem dizer nada apenas pensando em tudo que o irmão havia enfrentado para ter aquela mulher.
E George continuou:
- E agora não sei o que fazer. Nunca saímos daqui, não é? Não tenho como sair da vila, não tenho recursos. Minha única saída é procurar papai.
- Não sei se é uma boa ideia George, papai realmente não concorda com você.
Enquanto falavam, Ronald viu Mildred abrir a porta de sua casa, e disse ao irmão:
- Vamos sair daqui.
George estava decidido a voltar para a casa dos pais, Ronald pediu-lhe que primeiro deixasse que ele entrasse para preparar o terreno. E assim foi. Em minutos chamou George que entrou e abraçou a mãe. Contou-lhe o que aconteceu. Conversaram longamente e decidiram que juntos convenceriam o pai.  Ao chegar, o pai não gostou nada de ver o filho ali e já iniciou uma discussão. Ao final, George percebeu que na verdade, a maior preocupação do pai, foi a quebra do compromisso com o pastor e sua Mary, e prometeu ao pai que se pudesse contar com seu apoio, retomaria seu compromisso e o pai aceitou a ideia com entusiasmo.
No dia seguinte, George e o pai procuraram o pastor e falaram da intenção do filho. Ouviram um grande sermão , mas ao final, houve concordância, já que a tristeza de Mary preocupava o pai e ele sabia que a volta de George a faria feliz.
E foi o que aconteceu. George e Mary casaram-se meses depois. Ela muito feliz, ele apático para sempre, observando a felicidade de Mildred a distância até que alguns anos depois ela teve que deixar a vila pois corria o risco de ser acusada de bruxaria por criar medicamentos com as ervas. Era um período de intolerância e algum tempo depois, houve boatos de que havia sido morta pela inquisição.

Ela ouviu ao longe a voz de Sonia que dizia:
-Agora pode voltar ao normal, devagar, respire. E quando estiver pronta, pode se levantar.
Ela levantou-se e foi sentar na cadeira em frente à terapeuta, ainda espantada com tudo o que ouvira.
Sonia perguntou o que achara mas ela mais uma vez esquivou-se de fornecer pistas e apenas disse:
-Gostei sim, é possível fazer outra sessão?
- Claro, enquanto você sentir necessidade, podemos repetir o processo, mas pense em dar alguma informação ao seu respeito. E sorriu.
- Então fica assim, fazemos outra sessão e depois te digo algo sobre mi,
- Ok, marque com a secretária.

Ela marcou a sessão par dali a 15 dias. Saiu do consultório pensando no que ouvira e vira, pois enquanto Sonia falava ela podia dizer que via as imagens passarem na frente de seus olhos fechados, era como se estivesse revivendo a história. Na próxima sessão, prometeu a si mesma que após a regressão discutiria o assunto com Sonia e esclareceria suas suspeitas.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Parte 1

Como disse no post anterior, segue agora a primeira parte da primeira sessão de regressão de ela.

A voz de Sonia orientando a respiração foi trazendo calma e tranquilidade. Foram poucos minutos, sempre com a agradável sensação de envolvimento das luzes coloridas.

Em seguida,Sonia começou a falar:

- Uma praia com muitas pedras. Há muito tempo. Século XVII. Inglaterra.

A pequena vila litorânea tinha uma paisagem bela e selvagem. O mar batia forte nas rochas devolvendo as águas revoltas à praia em grandes ondas geladas.

O frio era intenso e a vida das pessoas corria ao sabor das estações, sem grandes alterações, embora o país estivesse fervilhando em uma revolução.

Mildred era uma linda jovem de longos cabelos ruivos que caiam pelas costas em caracóis. Vivia sozinha. O pai havia morrido em uma expedição de pesca e a mãe não suportara a perda do marido morrendo "de tristeza" como diziam,  logo depois.

Naquele tempo de lutas e violência fácil, muitas mulheres viviam sozinhas e isto não chamava a atenção.

Mildred ganhava seu sustento transformando ervas e folhas em medicamentos para todos os males. Aprendera o ofício com a avó.

Na vila havia mais 15 famílias, cujas casas distanciavam-se apenas alguns metros, o suficiente para manter alguma privacidade e manter os poucos animais.

Mildred acostumada à vida solitária e à concentração necessária para a produção dos medicamentos, relacionava-se pouco com os vizinhos, limitando-se a atendê-los quando buscavam sua ajuda e em poucos momentos da vida cotidiana.

Mas era observada.

George, vivia com os pais e seis irmãos todos homens e belos. Jovens mas trabalhadores. Era prometido de Mary, a  menina filha do líder religioso da vila.

George acostumara-se à ideia de que um dia se casaria com Mary, porém a visão diária de Mildred indo e vindo até a mata, macerando as ervas no pilão ou simplesmente caminhando no fim do dia pela praia o deixavam perturbado.

Sonhava com seus cabelos de fogo, seu porte altivo, decorava seus passos do dia à dia. Gostaria muito de falar com ela e aguardava ansioso por uma oportunidade.

E o dia chegou. Em uma tarde gelada o irmão mais jovem de George, Gilbert apareceu com uma febre alta e muita tosse. Sua mãe pediu a ele que fosse à casa de Mildred e pedisse o medicamento adequado.

George mal conseguiu conter a alegria.

Passou as mãos pelos cabelos, ajeitou as roupas e correu até a casa de Mildred.

Ela estava trabalhando no pilão e a imagem de seus cabelos esvoaçando quando ele a chamou, quase o fizeram esquecer do que fora fazer ali.

Começou a falar gaguejando e desconexo, não conseguia explicar ao certo do que precisava.

Mildred sem muita paciência ainda tentou esclarecer as coisas, mas desistiu e preferiu acompanhá-lo até em casa para ver o que se passava com Gilbert.

Lá, depois de definir o que seria necessário e recomendar que controlassem a febre com panos limpos encharcados em água do mar, disse à mãe dos garotos que o remédio estaria pronto no dia seguinte no início da tarde.

E assim como veio, indiferente ao desespero de George, saiu, mas não sem sorrir para si mesma ao lembrar-se do jeito desajeitado do rapaz.

Na manhã seguinte, após tomar uma xícara de chá, saiu para colher as ervas.

Na entrada da mata,quase por reflexo, percebeu a presença de George empoleirado no portão de sua casa para conseguir vê-la como sempre. Balançou a cabeça sorrindo achando graça. Já notara o interesse do noivo de Mary e isso lhe trazia um misto de orgulho e desejo de experimentar uma disputa com a jovem e bela filha do pastor. E naquela manhã enquanto terminava seu trabalho, decidiu que iria apostar na brincadeira.

Tinha certeza de que seria George que viria buscar o remédio, então resolveu arrumar-se mais do que o habitual. Colocou seu vestido mais belo, de um verde esmeralda que destacava ainda mais a cor de seus cabelos.Beliscou as faces, soltou os cabelos e aguardou, ciente de sua extrema beleza.

E no primeiro minuto do início da tarde, George tocou o sino de sua porta. Desta vez, ela não o atendeu na porta como fazia com todos,convidou-o a entrar enquanto embalava o remédio e dava as explicações necessárias sobre seu uso.Caprichou em movimentos leves e sedutores diante do rapaz que mal podia respirar. Ao final das explicações, olhou bem dentro dos olhos dele e disse que se houvesse dúvidas, voltasse para esclarecê-las.

Diante da paralisia do rapaz acrescentou: - Agora vá sr.Watson (era o nome de família), sua mãe deve estar ansiosa.

George sobressaltou-se como se acordasse de um sonho e balbuciou:- pode me chamar de George srta Taylor, deixe Watson para meu pai.

Mildred, lânguida respondeu: - George? Belo nome! E fez um ar de encantamento.

George encantado com as palavras, saiu aos tropeços dizendo palavras de agradecimento.

Gilbert foi medicado e recuperou-se em poucas horas.A sra Watson, feliz e agradecida disse ao filho: - George, acho que devemos oferecer à srta Taylor uma cesta de frutas pelo bem que fez ao seu irmão.

- Como queira mamãe. Disse George já agradecendo mentalmente a Deus pela nova chance .

E três dias depois do último encontro,lá estava George na porta de Mildred com uma linda cesta de frutas e flores arrumadas por sua mãe.

Desta vez não precisou tocar. Mildred estava lá fora pendurando roupas. Ao vê-lo apenas acenou com a cabeça para que entrasse. E ele, trôpego foi até ela..

George explicou o motivo da visita enquanto Mildred o olhava diretamente deixando-o ainda mais sem graça e confuso.

Como resposta ela apenas pegou uma das frutas mordeu-a e disse: - Deliciosa. Fico feliz que seu irmão esteja bem sr.... quer dizer, George.

- Sim srta Taylor, minha mãe ficou muito agradecida.

- Pode me chamar de Mildred meu caro.

George respirou fundo e disse:

- Obrigada srta, é muita honra. Eu .. eu gostaria de fazer uma pergunta. Gostaria de saber se poderia acompanha-la em sua caminhada noturna na praia.um dia desses. Poderíamos conversar um pouco, poderia me falar de suas habilidades com as ervas.... 

- Não George, não poderia. Mary e o pastor não aprovariam. Você sabe o que dizem, que sou estranha, não procuro as pessoas. Além disso, Mary é sua noiva!

- Me perdoe senhorita se fui muito ousado.

- Não, não foi ousado, apenas se esqueceu das regras básicas.O senhor é um rapaz comprometido.

E Mildred disse isso com ar de tristeza para o desespero de George que entendeu a mensagem como um sinal de aceitação caso não fosse noivo.

Ele desculpou-se várias vezes e foi embora. Nos dias seguintes, a cada visão de Mildred tinha mais certeza de que a queria para si e que para isso teria que desfazer-se do compromisso com o pastor e sua filha. Aquilo lhe deu uma coragem que desconhecia. E ao final do culto do domingo pediu para falar a sós com o religioso e contou a ele sobre sua decisão. O discurso interminável e raivoso era esperado. E o pastor ficou ainda mais irritado ao saber que os pais do rapaz ainda não haviam sido informados. Como George ousava desfazer um compromisso entre as famílias sem autorização deles! Mas decidiu que isso agora era problema de George. Chamou a filha até a sala e na presença do rapaz, contou-lhe o que estava acontecendo. Os jovens olhos azuis de Mary encheram-se de lágrimas mas ela não disse nada. Aguardou que o pai a autorizasse a sair e correu para casa. No caminho não pode deixar de notar  ao longe, Mildred conversando com um grupo de senhoras. E não podia definir se o que sentia era dor ou raiva.Seu coração parecia quebrado em mil pedaços. Em casa, trancou-se no quarto e atirou-se na cama e chorando muito decidiu que não aceitaria nenhum outro pretendente que o pai determinasse. Viveria só pelo resto da vida.

Em um lugarejo tão pequeno as notícias voam e quando chegou em casa, George já era esperado pelos pais cheios de perguntas e recriminações. A mãe chorava muito e o pai insistia em um discurso moralista. Falava de sua decepção por perder uma nora casta e de boa família e a cada sinal de que a decisão de George era definitiva, mais revoltado ficava o sr Watson até culminar na expulsão de George daquela casa.

George estava tão envolvido com seus sentimentos que não pensou duas vezes. Pegou algumas roupas despediu-se da mãe e saiu.

A vila não tinha moradias desocupadas. Havia como abrigo, apenas os restos de um velho celeiro incendiado há alguns anos. E foi lá que George largou sua trouxa e improvisou uma cama de feno. Em seguida saiu em busca de gravetos e lenha para fazer uma fogueira antes do anoitecer..

Os novos acontecimentos já haviam chegado aos ouvidos de Mildred. E ela, apenas ela, sabia dos motivos das atitudes de George. E sorria vitoriosa, imaginando quanto tempo aquele rapaz tão tolo levaria para procura-la.

Não demorou muito. Na manhã do dia seguinte, um George meio amarrotado pelas acomodações improvisadas e um tanto ruborizado batia a sua porta.

Mildred abriu a porta e fez cara de surpresa, dizendo um "George" doce e sensual.

George não se conteve e foi logo dizendo: - Srta. acredito que já conheça as novidades, assim vim refazer meu pedido para acompanha-la em seus passeios.

- Bem, como o senhor disse, diante das novidades isso seria possível, se o senhor tivesse uma aparência mais bem cuidada. Mildred disso isso olhando-o de cima a baixo com ares de desdém.

-Senhorita, me perdoe se não estou adequadamente vestido para me apresentar aqui,mas é que minhas novas condições...

- Está com fome George, disse Mildred interrompendo o rapaz.

- Ahn.... confesso que sim senhorita.

-Sente-se aí no alpendre que vou buscar algo para comer.

Ele obedeceu ainda meio confuso. Mildred voltou logo com a caneca de chá e um pedaço de pão. Sentou-se ao seu lado e disse: - Coma e depois se quiser pode usar a tina perto do pilão para um banho. E se quiser, pode dormir no alpendre enquanto não constroi uma moradia decente ou decide o que fazer.

- Tem certeza senhorita. Não vou incomodá-la?

- Se incomodasse eu não ofereceria. Preciso de ajuda com o corte de lenha e o carregamento de água lá da fonte. Se aceitar, estas tarefas serão a forma de pagamento pela hospedagem e pela comida.

- Ótimo senhorita.

- Mildred! ela disse

- Sim, Mildred, permita-me. E George pegou suas mãos e beijou-as.

Mildred as puxou rapidamente e disse:

- Então comece. Estou sem lenha para o jantar.